Pouca gente imagina o peso que uma criança carrega ao ver a própria mãe, referência e porto seguro, perder o controle diante do alcoolismo. Carolina Dieckmann tinha cerca de 10 anos quando sentiu esse abalo dentro de casa: depois do fim do casamento com o pai da atriz, Maíra Dieckmann mergulhou em um ciclo de dependência que durou uma década. Segundo Carolina, a dor era tão intensa que até o simples cheiro de álcool na respiração da mãe era suficiente para provocar um nó na garganta.
Diferente do que costuma acontecer em muitos lares, Maíra rejeitava qualquer tipo de ajuda formal. Jamais quis saber de terapia, grupos de apoio ou os famosos encontros de Alcoólicos Anônimos. Preferia enfrentar a batalha sozinha e recorria ao autodiagnóstico, usando o álcool como anestesia para perdas e ausências. Carolina lembra de noites tensas, fragilidades explícitas e do receio constante de repetir a história da família.
O medo ficou tão enraizado que, mesmo vivendo entre festas e celebridades, Carolina passou longe de taças e copos até completar 30 anos. Entre amigas, sempre evitava o assunto, afinal, o trauma era silencioso — mas constante. O medo de deslizar para um caminho parecido era real e, por anos, ela sequer cogitou provar o gosto amargo do uísque, bebida favorita da mãe.
O que poucos sabiam até agora é que Maíra, depois de anos de luta, conseguiu virar o próprio jogo sem nunca dar satisfações públicas. Segundo Carolina, a mãe venceu o alcoolismo por conta própria, enfrentando o vício “no peito e na raça”. Quando retomou a vida social, já era outra pessoa: voltava a beber, mas sem perder o controle — um desfecho raro e corajoso em histórias assim. Depois de perder a mãe em 2019, Carolina finalmente criou coragem para experimentar o uísque, numa espécie de ritual silencioso de despedida e perdão.
A ferida aberta durante anos se transformou em combustível criativo. Agora, Carolina encara o papel de Kátia Klein, uma mulher em processo de recuperação do alcoolismo, no filme Des)controle, dirigido por Rosane Svartman. Mais que um papel, a experiência virou uma espécie de catarse. Nos bastidores, Carolina revelou que as filmagens funcionaram como uma espécie de terapia: a cada cena, ela conseguia se reconciliar um pouco com os próprios fantasmas — e, ao mesmo tempo, dar voz a tantas pessoas que sofrem caladas com dramas familiares parecidos.
O filme, previsto para chegar aos cinemas ainda este ano, faz Carolina reviver dores antigas, mas transforma sua exposição em um ato de empatia. O relato corajoso dela se soma ao de tantos brasileiros que enfrentam o alcoolismo dentro de casa, seja como vítimas diretas ou como espectadores impotentes. O ciclo de sofrimento existe, mas mostrar essa realidade, sem filtros, pode ajudar a romper silêncios históricos.
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